quero crer, quero amar a vida, alguém...
e (eis porque sou um desgraçado imenso)
não posso crer, nem posso amar ninguém
Crer em quê? Amar o quê?
Descrever é não poder amar...A vida, pra vivê-la
não deve nunca ser compreendida;
a vida, se chegamos a entendê-la,
até nos envenena com a própria fé...
Crer em quê? Amar o quê?

Não ama quem já não vê...
Eu tinha uma alma crenta, a vida envenenou-a
(deixá-la envenenar)
o amor matou-me afé no amor, matou-a...
_e já não posso crer, nem posso amar...
Às vezes quero amar, desejo crer
que a vida é bela e justa e boa;
mas debalde...E, pra esquecer,
sôfregamente ponho-me a viver
para que a Dor me esqueça,
_como alguém que bebe à toa...
para cair mais de pressa
Crer em quê? Amar o quê?
Se tudo quanto existe é imperfeito e vão?
Às vezes tento iludir-me;
mas, quendo a minha fé parece firme,
reconheço que estou a mar sem fé...
É então
que me ponho a rezar essa oração
desesperada e triste (como aquela que reza quem já não crê):
_bendita seja a ilusão,e bem aventurados...
os que creêm nela
E eis aqui por que sou tão desgraçado:
_porque não posso amar, nem posso crer...
E vale a pena viver assim envenenado,
sem uma gôta d'água que conforte
tanta sêde? Não vale...
Mas enfimque remédio senão viver assim,
se também...já não tenho fé na morte!
Manuel Laranjeira
